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Altura, mobilidade e ilusão

  Em conversas de café um dos temas geralmente abordados é o dos avançados e de sua respetiva mobilidade. Ora, uma das armas de contra argumentação é a altura dos jogadores em questão, o que para muitos determina se o jogador é móvel ou não. Tal mobilidade (ou falta dela) é muitas vezes uma questão de velocidade para quem discute ou aborda este assunto, mas trata-se duma questão muito mais completa. Não física, mas tática. A altura dum jogador determina, muitas vezes, opções do treinador. É uma das armas mais importantes nalgumas vertentes: jogo aéreo, atrair marcação cerrada em lances de bola parada (deixando confortavelmente outros jogadores, se estivermos a falar duma marcação individual) e, obviamente, impor sempre uma figura possante em zonas de finalização. 
  
  Há um mito presente no mundo do futebol, qualquer que seja o país. Para uma vasta multidão ser alto e móvel não é fisicamente possível, mas por esses países fora há vários exemplos que mostram o contrário. Aliás, o avançado torna-se móvel se o treinador o assim quiser. Fernando Llorente, para dar um exemplo pragmático, é dono dos seus quase 2 metros de altura. Devido a supostos problemas de foro interno não está a contribuir regularmente para o sucesso da sua equipa, mas as impressões de passadas épocas estão à vista. Jogos com maior audiência portuguesa (nomeadamente os embates frente ao Sporting, em Lisboa e em Bilbao) deram a conhecer (ou aprofundar) as qualidades dum jogador que tenta transmitir uma mensagem com os pés. Uma que desfez um mito; afinal jogadores altos, com pernas longas e "desajeitados" podem camuflar-se num Vucinic, jogador há muito assumido como um segundo avançado e nunca como um matador. Aliás na Juventus há uma forte concorrência entre o montenegrino e o recém-chegado Giovinco, já que Quagliarella está de pedra e cal no onze inicial dos campeões italianos. 

  Voltando a Llorente, esse craque. É móvel, movimentando-se muito bem em zonas anteriores à grande área. É inteligente, o que ajuda muito na percepção do que se passa num raio considerável. Na teoria é difícil definir exatamente, mas Llorente consegue desafiar os mitos, banalizando-os ainda mais a cada drible, recuo no terreno e/ou ação defensiva. Claro que um bom apoio também ajuda, havendo espécies de trocas posicionais com extremos a derivar para o centro. Quando se fala nisto, é obrigatório falar em Muniain, jogador muitas vezes comparado a Messi pela sua criatividade, espontaneidade e qualidade técnica.

  Ora, foi importante referir isto porque é elementar que quem rodeia estes jogadores também é importante. Llorente tinha em Muniain uma arma preponderante para a bola chegar aos seus pés ou cabeça. Porque ninguém joga sozinho, apesar dos egos influenciarem tais atitudes. Mas isso já é outra história para análise futura.

  Tão diferentes, mas ainda assim tão iguais. Vucinic dum lado, o pequeno Giovinco noutro. 22 centímetros de diferença são mais do que suficientes para se fazerem as devidas diferenças entre estes jogadores, unidos pelo símbolo que têm ao peito. Vucinic é frequentemente atribuído a ter um grande jogo aéreo e presença na área, abstendo-se de outras funções que o fizessem recuar no terreno ou recair voluntariamente para uma ala. Ora, as aparências iludem e no futebol esse velho dito é uma verdade absoluta. É um autêntico polivalente, podendo representar qualquer lugar na zona atacante. Na Juventus de Conte (sobretudo na época passada)  foi utilizado muitas vezes a extremo-esquerdo, surpreendendo muita gente pela sua versatilidade e facilidade a atuar num lugar que não é o seu principal. É uma mais valia em qualquer caso, mas nesta época a sua estadia nas alas pode ter chegado a um término indeterminado. Com o 3x5x2 que se vê na Juventus é improvável que alguma vez volte a atuar nas alas.

  Asamoah e Lichsteiner são os jogadores mais utilizados nas alas no campeonato pela equipa campeã de Itália. Para quem segue o clube de Turim é fácil verificar que neste sistema tático referido acima tem grandes preocupações defensivas, tornando-se um 5x3x2 a defender. Vucinic não tem as características ideias para subir e descer no terreno constantemente, sendo um jogador meramente ofensivo. Daí fica tapado e disputa com uma vasta concorrência um dos dois lugares na frente de ataque, sendo que normalmente um jogador recua mais, atuando nas costas do ponta-de-lança para criar maiores desequilíbrios numa zona central e, sobretudo, apoiar a unidade mais avançada no terreno.

  Giovinco tem um apelido muito particular, derivado pelas suas duas características que o evidenciam mais: a baixa estatura física e a sua velocidade estonteante. Combinando estes dois elementos que o descrevem forma-se a "Formica Atomica". É um jogador previsivelmente (para quem o segue) desequilibrador, veloz, ágil e imprevisível. Aqui a aparência não ilude porque quem olha percebe logo do que se trata. Dum pequeno parasita que se cola às zonas onde há espaços. Se não há, inventa-os devido a movimentações rápidas, aproveitando a sua velocidade. Jogador semelhante a Vucinic, até. Em suma, é notório que no futebol as aparências iludem e, de facto, altura não é indicador de mobilidade. No futebol não há ciências exatas, além de que existem mitos que serão constantemente desafiados. Neste, jogadores como Llorente, Cardozo, Vucinic e Ibrahimovic desafiam aquilo que parece improvável para alguns.

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