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Os goleadores e o oportunismo

  Ernesto Farías, o protótipo de um rato de área. Um oportunista. Nesta época tivemos dois jogadores que se afirmaram pelas suas ações em campo como oportunistas ou desbloqueadores. Jogadores ágeis e matreiros que despistavam as defesas adversárias e espicaçavam as esperanças das outras formações. James e Nolito. Dois jogadores que por hábito de Vítor Pereira e Jorge Jesus eram lançados numa fase mais sensível da partida, onde muitas defesas as equipas mais debilitadas protegiam-se das ofensivas de Porto e Benfica. Como? Defendendo. A necessidade era de jogadores rápidos e imprevisíveis. Quase sempre resultava. Temos como exemplo uma partida onde o Porto venceu o União de Leiria por 4-0 com James a ser protagonista. Nessa noite de jogo no Dragão 27829 (número não oficial, mas obviamente quase exato, devido aos últimos dois dígitos serem o número do marcador do primeiro golo, neste caso Marc Janko) aplaudiram Varela e a entrada do jogador que para muitos ia explodir. Tinham razão. Esse jogo marcou uma afirmação ainda maior de Rodriguéz. Entrou, assistiu e até marcou. Marcou e marcou o jogo. Cobiçado por muitos, James continuou a sair do banco nas segundas partes até estabilizar no onze de Vítor Pereira, opção que dividiu adeptos portistas porque, por um lado, já estava rotulado como um desbloqueador ou alguém que entrava no jogo para destruir as fatigadas defesas adversárias. Noutro ponto de vista James era bem-vindo ao onze, achando que aquilo que demonstrava em meia-hora podia ser esticado para (quase) todo o jogo. Outro tema de conversa era a sua posição. Parecendo mais à vontade a 10 James foi sempre encostado ao flanco esquerdo, como extremo. Sempre que possível virava a curva e espalhava magia no centro com dribles e simulações que partiam uma defesa. Podia realmente ser o 10 indicado, devido à sua velocidade e criatividade no que toca aos seus dotes ofensivos. O que acabou por fazer Vítor Pereira foi adiantar Lucho a 10, jogando nas costas do avançado, sendo ele Hulk ou Janko (raramente era dada uma oportunidade ao dono do hat-trick de Vila do Conde, Kléber). Acabava por não convencer tanto como um 8 natural como foi e é Moutinho, um dos catalisadores desta conquista do 26º campeonato da história portista. Ele dribla, finta, visualiza o jogo de uma maneira particular e, mais importante do que tudo, sabe o que fazer. É rápido nas decisões. E essa espontaneidade também é importante na liberdade criativa dos avançados. 

  Noutros tempos não havia Moutinho, mas havia Lucho. E Farías, importantíssimo a sentenciar jogos. El Tecla tinha o dom de dividir as plateias no Dragão, nos sofás e nas conversas de café. Pelos registos foram 23 golos em 54 presenças no campeonato português. Na casa dos 0,40 golos por jogo. Uma média que a meu ver acabaria por ser positiva e de que forma. Falamos dum jogador que muitas vezes tinha metade da primeira parte para marcar um golo. E fazer isso em cerca de metade dos seus jogos tratava-se de um feito impressionante, não sendo Ernesto um jogador que estava rotulado como estrela vindo do River, marcando 49 golos em 93 jogos. Ainda assim era um registo de se lhe tirar o chapéu. A titular não rendia tanto.  Melhor quando Jesualdo o incluía no onze ao mesmo tempo de Lisandro. Muitas dores de cabeça. Daí o rótulo: um desbloqueador. Rato de área, carrasco dos adversários mais complicados de romper. Esperava-se que fizesse furor no Brasil, mas neste momento está emprestado ao Independinente da Argentina. O futebol português gostava de Farías, o brasileiro nem tanto. Uma pena, visto ser um jogador que complementava bem o campeonato. O derradeiro oportunista do futebol português, o Inzaghi do nosso futebol (respeitando as grandes diferenças de qualidade entre ambos, obviamente).

  Fim dum ciclo, início doutro. Farías, assim como Lisandro (embora o primeiro apenas abandonasse na época a seguir) saíram do clube da invicta. Farías causou muito pouco impacto. Tão pouco que saiu. Foi emprestado. Ainda assim o Porto perdeu mais sem Lisandro. Ainda assim encaixou mais. Licha juntou-se ao outro argentino no OL, ainda que mais subtil. Delgado. Hoje atua noutros ares, noutra cultura de futebol. Monterrey, México. Dito isto, o Porto ficou carenciado. Jesualdo necessitava dum matador. Que melhor clube para se procurar do que o River Plate já referenciado acima? Desta não argentino, mas colombiano. O primeiro pós-Rentería que passou (e não passou) pelo Porto. Esteve 4 anos mas apenas fez 6 jogos. Não marcou qualquer golo. Falcao, 'El Tigre'. Seria ele o goleador de Jesualdo e, futuramente, de Villas-Boas. Rotulado de goleador no River, clube que de resto vem mostrando ser uma fantástica plataforma de lançamento para jogadores de grande qualidade. Quem diria que o fado lhes daria a 2ª divisão do seu país. Resultados práticos imediatamente. Chegou ao Dragão e igualou o recorde de melhor início. 4 golos no mesmo número de jogos. Hoje um dos principais problemas de Vítor Pereira é a falta dum Farías, dum Licha ou agora dum Falcao. Mas Kléber deixou altas expectativas para a próxima época. Marcou 5 em Vila do Conte, um verdadeiro amuleto. Dois na pré-época e o único hat-trick da época na última jornada do campeonato.

Viajamos agora no país. Visitamos o Norte e localizamo-nos no litoral. Eis Lisboa, a cidade capital. Nela se encontram duas das três equipas mais históricas de Portugal. Os 'grandes'. 

  Chegamos à Luz e lembramo-nos do momento mais agridoce da história da nossa seleção. Culpem os gregos. Tragédia para Portugal. Ainda hoje me lembro do desânimo que se vivia na época ao ver o cabeceamento de Charisteas tocar as redes. Passaram oito anos desde a vitória grega que espantou a Europa. Focando-me no Benfica somente, tenho que falar em Cardozo. Pena que peque por irregular. Marca regularmente, mas é (demasiado) perdulário. Ganha por ser bem servido. Mas é pouco eficaz. É normal tratar Cardozo como o que virou de besta a bestial...ou de bestial a besta. Tudo depende da hora. Desde marcar frente ao United e levantar os 65.000 na Luz a marcar a mandar calar os adeptos. Trapalhão, às vezes polémico, mas focado na baliza. Não consegue ser, regra geral, oportuno. E divide os adeptos lisboetas, tal como acontece noutro caso do futebol português. O holandês de nome complicado. Wolfswinkel. Este ainda difícil, ainda assim, avaliar.

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