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A vida irónica dum guarda-redes

  No dia de ontem meti-me no fundo do baú a observar os meus escritos de há quase 2 anos. Deparei-me com uma pequena crónica que não tinha mais de 20 linhas. Era clara e objetiva, mas faltava iniciativa nas palavras, imaginação e paciência para desenvolver mais o tema abordado. Foi escrita a propósito do Barcelona x Arsenal que decorreu no dia 8 de março de 2011, onde a equipa catalã venceu por 3-1, num jogo polémico que consumou a eliminação dos ingleses da competição, assim como caminho aberto para a conquista do troféu por parte dos espanhóis.

  Nesse pequeno texto abordei essencialmente a frustração da vida de um guarda-redes e a certa ironia que nela está presente. Como exemplo prático falo de Almunia, já que o jogo em questão tinha sido 10 dias atrás (e a ideia de escrever esse texto referido já tinha vindo desde essa dezena de dias atrás) e a memória ainda estava razoavelmente fresca. Apesar das 7 defesas, sendo que algumas de teor praticamente impossível para outros, acredito que a maior parte das pessoas e espectadores desse jogo (quase) só se lembrem das aventuras de Messi, sobretudo daquele chapéu ao espanhol que deu o 1-0. De qualquer forma, por esta última frase chegamos ao ponto principal desta crónica: a ironia que compõe, de facto, a vida dum guarda-redes.

  Na imagem acima está representado Edwin van der Sar, um guardião extremamente seguro e com uma carreira recheada de títulos, isto é, pelo menos um em cada clube que passou com idade sénior (não se faça exceção a sua estadia em Londres, donde venceu uma Taça Intertoto pelo Fulham). Registo impressionante para aquele que é considerado um dos melhores guarda-redes da sua geração, juntamente com outros nomes como Oliver Kahn ou até mesmo Barthez. Raramente falhavam, mas quando o faziam ninguém falava de outra coisa. As pessoas têm tendência a olhar para o mal com maior intensidade do que o bem. Ora, nesse cenário era natural que nos momentos seguintes aos jogos só se falassem dos tais erros dos guarda-redes, ignorando possíveis grandes intervenções ou lances onde foram fulcrais para manter o resultado favorável. Olhando apenas para o que falhou há claramente uma grande ironia envolta na situação... e essa consistia em descredibilizar uma boa exibição para olhar para um lance infortuno.

  Muitas vezes os principais visados nas derrotas são os guarda-redes porque: não estavam atentos ao decorrer do lance, não se atiraram a tempo, 'levou um frango' e/ou esteve mal na abordagem ao lance. Pois bem, há quem se recorde do golo e da postura do guarda-redes a abordar o finalizador, mas não faz a mínima ideia de como a bola chegou a ele. Culpam os guardiões sem de facto saberem ou recordarem-se concretamente de quem facilitou ou errou, deixando que a bola fosse parar à frente do homem das luvas. Defesas, médios ou mesmo avançados conseguem muitas vezes sair impunes nestas situações em lances em que os pobres guarda-redes são, por vezes, os que menos culpa têm. No entanto são os que pagam as favas. Quase sempre.

  O ilustre van der Sar tem, durante toda a sua carreira, erros relevantes que se podem contar com os dedos duma só mão. Por alto recordo-me de 2 que já tive oportunidade de ver em vídeo:

  - Perda de bola para José Antonio Reyes na grande área que marcou sem qualquer preocupação (Fulham 0-3 Arsenal, 11 de setembro de 2004);

  - Bola aparentemente controlada que deixa cair após cruzamento encostada de seguida por Somen Tchoiy (Manchester United 2-2 WBA, 16 de outubro de 2010)

  Tenho a certeza que esses 2 erros são mais lembrados do que algumas defesas do outro mundo que possa ter feito no mesmo ou noutros jogos pelo Fulham e Manchester United respetivamente. O mesmo se aplica a outros guarda-redes por esse mundo fora. Mais recentemente há o exemplo de Hélton que deixou a desejar no 2º golo do Paris Saint Germain no jogo de França, mas tem estado irrepreensível em todos os jogos, por exemplo, da Liga Portuguesa. Os guarda-redes são nesta vertente os mais observados, os centros das atenções. Quando a coisa não corre bem são eles a que são apontados os dedos. Pena que assim seja, muito sinceramente. A pressão está do lado deles.

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